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Questões sobre a escolha
do tipo de parto

“O que esperar quando se está esperando”:

Questões sobre a escolha do parto.

 

Texto escrito por Carmen Alcântara*

 

 

O filme que estreou recentemente com o título acima, estrelado por Rodrigo Santoro e Jennifer Lopez, aborda de uma forma leve e descontraída os temas da gravidez, parto e adoção.

 

O tema do parto, especificamente, me chamou a atenção devido a uma mudança muito grande que vem ocorrendo nas últimas décadas aqui no Brasil, por uma preferência cada vez maior pelo parto cesárea.

Em contra partida, no filme, passado em 2012, nos EUA, vemos mulheres lindas e de ótimo nível social dando à luz através do parto normal.

 

Há exatos quatorze anos, quando minha filha caçula nasceu (a terceira, por parto normal), eu e a maioria das mulheres que conhecia, sonhávamos em ter parto normal e amamentar por pelo menos seis meses. Conseguíamos encontrar com certa facilidade, médicos a favor do parto normal e que nos apoiavam em nossa escolha desde que houvesse as condições necessárias para tal. Contudo, o que me chamou a atenção quando esta filha nasceu, é que no momento do parto, várias enfermeiras entraram na sala, porque queriam assistir a um “parto normal”. Disseram-me que eram partos cada vez mais raros, ou seja, o normal já estava se tornando “anormal”.

 

Dr. Paulo Goffi, era provavelmente o mais conhecido obstetra, muito favorável ao parto normal, falecido há alguns anos, era um grande mestre da obstetrícia e um verdadeiro “parteiro” da cidade de São Paulo, (foi capa da Veja São Paulo com este título), pelas centenas de partos normais que realizou em nossa cidade, deixava as pacientes confiantes que a hora que fosse ele estaria lá e realizaria o parto de preferência normal, em situações inclusive muito difíceis, como o parto pélvico. Quem teve o privilégio de assistir a um desses partos, ficava impressionado com sua calma, habilidade e precisão nas manobras.

 

Hoje em dia, o que mais escuto entre mulheres “jovens, lindas e de ótimo nível social’ é a preferência pelo parto cesárea”. Ninguém mais quer ter surpresas e ser pega, sem estar com as unhas e o cabelo feito, nem sentir dor, muito menos se submeter ao “trabalho de parto”.

“ - Para quê tanto sacrifício, se a cesárea é tão mais rápida, indolor, dá para se planejar e os médicos na maioria das vezes incentivam este ato cirúrgico”?

 

Com certeza ainda existem discípulos do Dr. Paulo e outros médicos favoráveis ao parto normal, mas sei também que para muitos obstetras, a cesariana é sem dúvida muito mais rápida e prática, muitas vezes não é preciso desmarcar os consultórios, enquanto o parto normal pode demorar de 4 ou 6 horas.

Também não há o inconveniente de ser chamado de madrugada ou no final de semana.

 

A pergunta então é, por que paises como EUA e muitos da Europa têm taxas de cesarianas bem menores do que o Brasil, onde o Sistema Público de Saúde conta com bem menos recursos do que estes outros paises?

 

Acredito que alguns dados são importantes de serem apontados para que as mulheres que estão esperando  bebês possam fazer uma escolha do parto, dentro das suas condições de saúde, o mais consciente e responsável possível.

 

Em primeiro lugar vamos às vantagens do parto normal, lembrando que me refiro ao parto realizado no hospital, com todo o suporte médico e técnico necessário:

 

- Não sendo uma cirurgia, a recuperação é muito mais rápida.

 

- A rápida recuperação deixa a mãe mais tranqüila o que favorece a lactação mais rápida.

 

- A alta é também mais rápida e, portanto há menos risco de infecção hospitalar para a mulher e o bebê. A mulher pode voltar mais brevemente para a sua rotina, inclusive de exercícios físicos.

 

- Se a mulher vier a sofrer de mioma, na eventual necessidade de cirurgia, esta será mais fácil, pois depois de uma cesárea há maiores chances de aderências.

 

- O relaxamento da musculatura pélvica no parto não altera o desempenho sexual, principalmente depois de uma episiotomia bem feita.

 

- Os pulmões do bebê são comprimidos na passagem do canal vaginal e isso impede que ele tenha o desconforto respiratório, muito comum em crianças nascidas por cesariana.

 

- Finalmente, o sentimento de recompensa para a mulher é enorme, por seu próprio esforço e de seu filho! A dor existe, é real, mas absolutamente suportável, é também uma dor que não deixa lembranças, a recompensa é muito maior!

 

- O sentimento de proximidade e de que a mulher tem a força de uma “leoa”, fortalece o vínculo e a segurança de poder cuidar e proteger sua cria. Talvez por isso as pesquisas apontem para uma porcentagem muito menor de mulheres que desenvolvem depressão pós-parto, em partos normais do que em cesáreas.

 

É lógico que partos normais também oferecem riscos e tem contra indicações: em gravidez de risco; em mulheres que tem bacia estreita, pressão alta, diabetes, quando o bebê é muito grande ou está em posição pélvica ou outras situações em que a cesárea precisa ser feita para não por em risco a mãe e o bebê. Nestas situações, o parto cesárea pode significar a diferença entre a vida e a morte e é extremamente necessária.

 

Refiro-me aqui a certas situações que estão se tornando rotineiras em vários consultórios, nas quais as pacientes querem a cesárea porque é mais fácil, porque querem determinar a data de nascimento do filho por ser mais conveniente para elas ou para a família ou por querer homenagear algum familiar nascido na mesma data, sem levar em conta os riscos que o bebê corre se nascer antes da data. Em conversa com alguns obstetras, eles me contam que tem que argumentar sobre os riscos e muitas vezes se negar a fazer o parto se a paciente insistir em pré-determinar a data.

 

Vamos então enumerar alguns dos riscos de uma cesárea, assunto que quase ninguém menciona para que, quando for possível a opção, a mulher possa fazer pleno uso de sua capacidade de discernimento e de uma liberdade consciente. Caso ela encontre objeções do médico ao parto normal, não havendo razões muito claras, pode-se optar por ouvir uma outra opinião.

 

Riscos do parto cesárea:

 

- O risco de morte materna é 16 vezes maior do que no parto normal.

 

-As dores após a cirurgia são do corte na barriga e da manipulação da cavidade abdominal.

 

- Risco aumentado em relação ao parto normal de infecção, inflamação, hemorragia e perda do útero.

 

- Aumenta em quase 100% as chances de outro parto por cesárea.

 

- Risco de quelóide e aderências.

 

- Risco de o bebê nascer antes do tempo por erro de cáculo gestacional e como conseqüência, maior probabilidade de imaturidade pulmonar e possível internação na UTI neonatal.

 

- Desconforto respiratório maior entre os bebês nascidos por cesariana do que por parto normal.

 

- O bebê passa por mais riscos de sofrer intervenções como: aspirações nasogástricas, reanimação, entubação e respiração artificial.

 

- Possibilidade de depressão materna muito maior na cesárea do que no parto normal.

 

Por tudo isso, pesando prós e contras, é possível a meu ver, ter mais coragem para enfrentar algo que a natureza nos deu, algo que se chamou normal e que de tão raro está se tornando quase anormal, assim como tudo hoje em dia que demanda trabalho e um pouco de sacrifício para sair da zona de conforto. Contudo, cada um sabe dos seus limites e a idéia aqui é fazer pensar.....

 

Para aqueles que pensam em adotar, vale assistir o filme e ver a cerimônia de adoção na África, uma cena lindíssima e emocionante.... um verdadeiro rito de passagem.

Vale lembrar que, tanto a adoção como o parto são momentos de um ritual de passagem: passagem da mulher para se tornar mãe, do homem para se tornar pai e da criança  que sai do útero para a vida, com todo o seu amplo significado.

 

* Psicóloga e psicanalista, mestre pela Faculdade de Medicina USP

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